Egito, o país do Squash?

Você não leu errado o título desse texto. A pergunta a ser respondida é essa mesmo. Olhando o ranking da Associação Profissional de Squash (PSA), a resposta parece bem óbvia. No masculino, seis dos 10 melhores ranqueados são do Egito, enquanto no feminino há quatro atletas. Isso sugere, então, um sim emblemático à pergunta. Mas a realidade não é bem essa.

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Imagem: psaworldtour.com
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Imagem: psaworldtour.com

Apesar da supremacia no Squash, o esporte mais popular no Egito é o mesmo que reina aqui no Brasil: o futebol. Por isso, este último, inclusive, recebe a maior parte da atenção da mídia e de recursos privados. Nada mais que uma lógica de mercado. Afinal, em um país com cerca de 82 milhões de pessoas, e, pasmem, sem um quantitativo grande de atletas de Squash, a atenção tende a se voltar para o futebol. Isto é, o esporte da massa. Mesmo com esse cenário, como explicar, então, o sucesso egípcio?

Clubes desportivos no Egito

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Gezira Sporting Club | Foto: cairoscene.com

Cabe mencionar que na história do Squash, desde os primórdios já houve grandes atletas egípcios. Além disso, esse país sofreu forte influência inglesa no século XX. Logo, a presença de clubes desportivos (exemplos: Sporting, Gezira, Zemalak) na capital Cairo ajudou e continua a promover o esporte. Esses espaços são predominantemente frequentados pela classe média e a elite. Contam com piscinas, quadras, pistas e campos. Consequentemente, são usados para a prática de esportes como a natação, futebol, handebol, tênis e o squash1. Por isso, desde cedo, atletas juniores podem praticar com jogadores do mais alto nível. Um adágio conhecido diz que você é tão bom quanto aqueles que o rodeiam. Faz pleno sentido quando se contextualiza com o Squash no Egito.

Influência política e de outros jogadores

Apesar de ter passado um período ausente dos grandes torneios, durante os anos de 1990 houve um ressurgimento, promovido tanto pelo então presidente egípcio Hosni Mubarak – também jogador de Squash – e pelos atletas Amr Shabana e Ahmad Barada. A realização do torneio com uma quadra de vidro em frente às piramides em 1996 e o sucesso de Barada (segundo lugar no torneio e posteriormente segundo lugar no ranque mundial) impulsionaram o interesse do país no esporte. Barada, inclusive, foi pessoalmente recebido e parabenizado por Mubarak2. Ou seja, virou quase um herói nacional.

Daí em diante, o referencial dos jovens atletas egípcios subiu. Isto é, a conquista do primeiro lugar no ranque profissional por Amr Shabana em 2006 – primeiro egípcio a conseguir o feito – consolidou esse momento. Logo, ele passou a ser tanto a referência, bem como o jogador a ser batido. Diante disso, diversos outros atletas surgiram no embalo do sucesso. Daí em diante, pode-se dizer, consolidaram o reinado egípcio na década de 2010. Nomes como Karim Darwish, Ramy Ashour e Mohamed El Shorbagy são bons exemplos.

Talvez, uma analogia que ajuda a entender o sucesso egípcio no Squash pode ser feito com nosso país, mas em outro esporte: o vôlei. Isto é, o sucesso da medalha de ouro nas olimpíadas de Barcelona gerou um interesse dos jovens por esse esporte. Consequentemente, levou a formação de atletas cuja referência era justamente a equipe vencedora de 1992. Por isso e outros fatores, o Brasil se tornou presença quase sempre carimbada nas finais das principais competições.

Estilo de jogo dos atletas do Egito

Para explicar o sucesso do Egito no Squash, cabe comentar sobre o estilo de jogo dos atletas desse país. Isto é, diferentemente do modelo tradicional, baseado em longas trocas de bolas, os jogadores egípcios adotam um estilo mais baseado no ataque3. É análogo ao adágio do futebol que diz que “a melhor defesa é o ataque”. Em outras palavras, os atletas do Egito aplicam um jogo agressivo, não deixando passar oportunidades de matar ou ter a iniciativa do ponto. Seria um contraponto ao modelo de não assumir riscos ou de priorizar apenas jogadas com maior probabilidade de acerto (por exemplo, bola no fundo de quadra ou, ainda melhor, no backhand do oponente). Veja o vídeo a seguir para entender.

QuickHit: Incredible rally from Hesham and ElShorbagy

Hesham and ElShorbagy bring the house down in Manchester with a stunner of a rally!!! #AJBellWorldChamps

Posted by Squash – PSA World Tour on Sunday, December 10, 2017

Mais uma vez, pode-se fazer uma analogia com um caso brasileiro para compreender esse contexto. Nesse caso, com o futebol. Nosso país é conhecido pela criatividade dos jogadores ao longo da história. Mesmo que o momento atual não seja condizente com isso, não dá para negar essa característica de nossos atletas. Consequentemente, é comum que o jogador brasileiro valorize mais o drible do que, necessariamente, o resultado em si da jogada. Boa parte das pessoas, por exemplo, aprecia a seleção de 1982 mais do que a de 1994 mesmo sem ter ganhado a Copa do Mundo.

Algo parecido acontece com os squashistas egípcios. Ou seja, valorizam a criatividade e um estilo um tanto diferente do convencional. Não é por acaso que o apelido de Shabana no circuito profissional era “O Maestro” e o de Ramy Ashour é “O Artista”. São dois estilos de jogo que geraram muitos fãs em todo o mundo. Veja o vídeo com as 10 das melhores jogadas de Shabana.

Contraponto

Por fim, cabe um contraponto ao que foi apresentado até então. Principalmente quanto ao primeiro e segundo pontos discutidos. Um comentário no Blog Serious Squash me chamou a atenção para um fato. Por isso, reproduzo adaptado a título de curiosidade. O intuito é também refletir sobre a história que tradicionalmente se apresenta em outras fontes e que, inclusive, foram utilizadas nessa postagem.

Parece que, apesar do sucesso egípcio no Squash, esse esporte não é tão popular quanto se pensa. Nomes como Ramy Ahour, El-Shorbagy e Shabana não são tão familiares no público de uma maneira geral. Fora da comunidade do Squash, poucas pessoas lembram ou reconhecem quem são os jogadores do Egito que estão no topo do ranque da associação profissional (PSA). A maior parte dos jogadores egípcios vem de famílias de melhor renda, capaz de pagar a filiação a clubes de elite – como os já mencionados Sporting, Gezira, Zemalak – e o treinamento com treinadores de ponta. Isso, inclusive, criou uma comunidade razoavelmente fechada no Squash, com sua própria subcultura, que se orgulha de suas conquistas sem, necessariamente, esperar reconhecimento em seu próprio país. 

É interessante notar que os melhores atletas egípcios do ranque mundial não têm sua base no próprio país. Isto é, Amr Shabana se consolidou no Canadá, os irmãos Shorbagy em Bristol na Inglaterra, Ramy Ahour em Nova Iorque e Ali Farag em Boston (Harvard) nos Estados Unidos. Nada muito diferente do que acontece com atletas brasileiros de futebol e de outras modalidades esportivas que procuram oportunidades em outros países.

Logo, as perguntas que se apresentam agora são: O reinado egípcio perdurará? Caso sim, por quanto tempo? As modalidades esportivas são sempre cheias de surpresas. Consequentemente, se o Squash se tornar olímpico será que esse cenário muda? Bom, só o futuro dirá.

Reportagem sobre o Squash no Egito

A BBC, tradicional canal de comunicação britânico, por meio de sua correspondente na África fez uma reportagem especial sobre o sucesso egípcio no Squash. Pena que não foi disponibilizado nem legendas em inglês. Pois se isso tivesse sido feito, teria-se a opção de pedir a tradução automática para o português. Logo, para entender tudo, é preciso compreender, obviamente, o inglês. Mesmo assim, acreditamos que seja interessante assistir.


1http://internacional.estadao.com.br/blogs/gustavo-chacra/com-seus-clubes-esportivos-o-egito-e-a-p/
2https://www.theatlantic.com/international/archive/2014/11/why-egypt-crushes-at-squash/383062/
3http://www.serioussquash.com/2014/09/why-egyptians-are-ruling-squash-court.html

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